Burnout: Um olhar psicológico

A Síndrome do esgotamento profissional, mais conhecida como Burnout é um estado de exaustão física, emocional e mental resultante da exposição prolongada às situações de estresse no ambiente de trabalho. O termo vem da língua inglesa e pode ser traduzido como “apagar” a partir do estado de esgotamento extremo. No consultório é muito comum escutar termos “crise”, e a experiência de “quebrar”. Refiro-me ao quadro como experiência justamente porque cada pessoa que passa por isso tem uma diferente história para contar, ou seja, a questão não é apenas “ter um burnout”, mas como o burnout se singulariza em cada narrativa.

É claro que há sintomas importantes da síndromes como exaustão emocional, baixa na realização pessoal, sentimento de dúvida sobre as próprias capacidades, sensação de fadiga e/ou irritabilidade, e dificuldade com foco. Os sintomas físicos parecem ser, no entanto, o gatilho que faz com que a pessoa perceba que realmente está passando por um problema. Muitas vezes o corpo fala aquilo que a boca não consegue dizer. Dores físicas, problemas com sono, questões gastrointestinais são alguns dos aspectos que podem ser vivenciados.

 Mas o que será que efetivamente colapsa na pessoa? É importante situar que em nosso tempo histórico, o imaginário coletivo costuma desenhar o conceito de sucesso relacionado ao dinheiro, poder e status. Isto tudo tende a ser associado, inconscientemente com o ideal de trabalho árduo. A atividade (aquilo que cada um faz) costuma fornecer aspectos identitários importantes, e legitima a existência de alguém pelo reconhecimento social. Tal reconhecimento tende a constituir a autoimagem da pessoa, gerando o imperativo “eu existo PARA isso”.

Neste sentido, perceber quanto e como o trabalho produz a própria identidade parece importante para pensar como ele vai ocupando uma parte significativa da vida, quanto tempo ele toma, e quanto se permite que ele “engula” outras áreas da vida. Queixas como a falta de tempo para família e amigos são muito comuns quando as pessoas, inconscientemente, vão incorporando o ideal de excelência profissional.

Muitas vezes, essa dedicação inabalável ao trabalho pode resultar em uma ausência emocional involuntária. É como se, ao focar demasiadamente no sustento da família, ocorresse um afastamento emocional como efeito colateral. Isto acarretaria, inadvertidamente em uma espécie de “meia presença” com quem se ama. Afinal, é humanamente impossível estar em todos os lugares ao mesmo tempo. Neste sentido, a “balança da vida” vai ficando desequilibrada, e é geralmente aí que crise costuma aparecer.

Justamente por isto é muito comum passar pela perda de sentido. Aquilo que antes alimentava, passa a dar a sensação de esmagamento. Quando todas as fichas são apostadas no campo do trabalho, qualquer ameaça neste terreno parece soar potencialmente destruidora. Aí é muito comum experimentar a raiva e o ressentimento referente ao contexto laboral, com as pessoas envolvidas nele.

É muito comum se ressentir com as pessoas no contexto de trabalho que corroboraram com a sobrecarga que se vive. No entanto, é importante pensar que quase sempre esse fenômeno se manifesta com a dificuldade em colocar limite. O medo de desapontar os outros pode ser um obstáculo para isso. É como se ao dizer sim, se evitasse a desaprovação, e aí só sobrasse a opção de aceitar mais do que se pode. Também existe o medo de perder oportunidades de carreira. É curioso pensar, no entanto, que todos esses medos tendem justamente a invisibilizar a pessoa, uma vez que suas necessidades precisam ser escondidas em detrimento do resultado que precisa aparecer.

Então, quando somente o trabalho e resultado podem existir, a tendência é banir o tempo de descanso. Não me refiro aqui ao descanso para ficar disposto, pelo contrário, refiro-me aqui ao descanso somente pelo descanso. Ter um tempo destinado para fazer nada, no qual se possa criar qualquer coisa parece um fenômeno cada vez mais escasso. Um tempo sem qualquer compromisso pode ser muito potente até para que possa descobrir quais são as tuas reais necessidades. Será que nesse tempo se desejará dormir, assistir um filme, pintar um quadro, escrever uma história, tocar violão, plantar uma flor?  Seria um tempo para se passar sozinho, para bater papo com uma amiga de longa data, ou pra dar risada com as crianças?

O tempo do ócio criativo é o tempo de intimidade profunda com o próprio eu. E costuma ser justamente nesse tempo de relaxamento que as maiores sacadas vêm. As vezes é neste tempo de silêncio, de contato profundo com seu eu que muitas respostas surgem facilmente. Criar espaço entre tarefas, entre dias, entre fases mais e menos intensas parece bem importante para que se digira tudo o que foi vivido. O psiquismo precisa de espaço para digestão (talvez tanto quanto o estômago, rs). Em alguma medida, trata-se de se integrar com a natureza. Ela opera essencialmente de forma cíclica, afinal, há flores na primavera, mas as folhas caem no outono. O curioso é que nenhuma estação é melhor que a outra. Todas são apenas manifestações da natureza. Por que precisaria ser diferente contigo?

Se você está passando por isto ou conhece alguém que está, saiba que a compreensão e o apoio são fundamentais. Cada passo em direção ao autocuidado é uma vitória, e é necessário ter gentileza e a paciência nesse momento.

Nós, como seres humanos, somos resilientes, capazes de aprender e crescer com as adversidades. Juntos, podemos criar ambientes de trabalho mais saudáveis e cultivar uma cultura que valoriza o equilíbrio e a saúde mental.

Cristina Gonçalves de Abrantes

Psicóloga e Orientadora Profissional CRP 06/135259

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