Você já pediu um conselho? E já deu algum? Você já deu um conselho e ajudou alguém? Já deu um conselho e foi ignorado? Deu um conselho e acabou embananando a vida de uma pessoa?
O conselho pode parecer tão cotidiano, que algumas vezes os banalizamos e não paramos para pensar nas reais repercussões que podem ter.
Eles são espécies de opiniões, avisos ou ensinamentos do que cabe ao outro fazer, pensar e/ou sentir. Em alguma medida, o conselho expressa o que o conselheiro faria no lugar de alguém. Há um ditado popular que brinca que se o conselho fosse bom ele não seria de graça, mas eles não são bons ou ruins a priori. Eles podem acabar ajudando, mas podem atrapalhar também. Afinal, quando é o momento de pedi-los ou transmiti-los?
Quando pedir um conselho?
Algumas vezes não sabemos qual decisão devemos tomar. Quase sempre se trata de situações que envolvem “escolhas difíceis”, ou seja, quando os caminhos são quase igualmente bons, quase igualmente ruins, ou envolvem vantagens e desvantagens muito complexas.
Nesses casos acaba sendo difícil saber o que fazer. Ficamos na dúvida entre seguir um caminho ou outro. Então, os conselhos podem ser pedidos com o intuito de compartilhar as próprias decisões com os outros e assim, adquirir sentimento de segurança. Ao compartilhar nossas angústias com pessoas próximas, podemos nos sentir mais respaldados e seguros para dar o próximo passo.
É importante observar, no entanto, se você está com alguma dificuldade em arcar com a responsabilidade da própria decisão. Nesse caso, pedir um conselho pode ser uma forma inconsciente de se isentar das consequências de sua escolha.
Em muitas situações, no entanto, não se tratará da isenção total da responsabilidade, mas da busca da pluralidade de opiniões e visões de mundo, com o intuito de enriquecer o próprio repertório pessoal. Dessa forma, pode haver a emergência de uma nova configuração de “visão de mundo”.
Descritas essas possibilidades é importante avaliar o quanto você está buscando a isenção da responsabilidade e quanto você está buscando enriquecer o próprio repertório. Para todos os fins, as consequências das suas decisões serão predominantemente suas (e eventualmente irão atingir outras pessoas, por isso, sempre que possível vale consultá-las).
Algumas dessas consequências serão previamente avaliadas e controladas, outras serão novas e espontâneas. Lidar com o imprevisível faz parte de tomar uma decisão, além de “bancar” os aspectos conscientes e inconscientes que nos levaram a escolher o que quer que fosse.
Essa reflexão nos leva a uma outra pergunta:
Quando dar um conselho?
A resposta para essa pergunta parece estar relacionada com a reflexão acima. Vale compreender o motivo da pessoa ao te consultar, para averiguar se é o caso de dar um conselho ou de se calar. Caso você decida dar o conselho é muito importante enfatizar que você está colocando uma percepção que faz sentido para você, ou seja, não necessariamente fará sentido para outra pessoa. Se esse momento for um encontro autêntico entre duas pessoas, será produzido um diálogo, no qual haverá ideias prévias, exposições de contradições e formulação de novas ideias ou pensamentos. Isso quer dizer que alguma coisa muda, tanto de quem dá o conselho quanto de quem ouve, mas não deve haver importação da ideia do outro como se fosse sua.
Então, se for dar um conselho é importante lembrar que você não é o dono da verdade, e suas sugestões não são ordens. Se você precisa ser “obedecido” ao dar o conselho, vale reavaliar o possível lugar de poder que essa relação envolve. Esse é um ponto bastante importante. Há uma condição assimétrica no aconselhamento, na medida em que parece que alguém ajuda outra pessoa. Para que isso não caia em um contexto autoritário, é importante se ausentar da relação de quem diz ao outro o que ele deve fazer, mas ocupar o papel de alguém que se importa com aquela pessoa, e que pensa junto com ela o que ela pode fazer, sem mandar nela.
Finalmente, podemos pensar em nossa última pergunta:
Quando não dar um conselho?
Como exposto anteriormente, podemos refletir junto com o outro possibilidades de ação e pensamento, mas sem dar ordens. Algumas vezes, no entanto, pode ser melhor estar junto ao outro, mas sem guiá-lo.
Uma possibilidade é a própria indisponibilidade emocional que podemos ter em aconselhar alguém. Algumas vezes, aconselhar pode exigir certa “energia vital” e nem sempre dispomos dela em abundância. Se nos sentimos sugados ao dar conselhos para alguém, vale avisar ao outro seu próprio limite. Seu amor e cuidado não morrem por esse ato, pelo contrário, cresce em você a possibilidade de se cuidar para cuidar do outro. Encaminhar essa pessoa a um acompanhamento profissional ou a redes de apoio do seu ciclo social são atos de carinho consigo e com quem quer o conselho.
Outras vezes nos depararemos com o dilema do outro e também compartilharemos a dúvida, ou seja, não saberemos o que fazer. Compartilhar a dúvida é se colocar em um lugar de horizontalidade também, já que não se trata de ter uma resposta pronta.
Vale lembrar que é muito importante não desprezar a dor da pessoa. Às vezes para acabarmos o assunto mais rápido falamos que “isso vai passar logo”, ou que “isso não é nada”. Sem querer, isso pode aumentar o sentimento de desamparo da pessoa, que se sente insuficiente para lidar com as próprias questões. Às vezes um “eu estou aqui” é melhor do que isso.
Isso nos leva a pensar no tópico final dessa reflexão. Para nossa sociedade é muito difícil se deparar com o problema sem resolvê-lo o quanto antes. Muitas vezes, nos apressamos em soluções rápidas sem compreensões profundas dos que formou aquele problema. O resultado disso é ter as coisas resolvidas no plano aparente, mas que quase sempre voltam a se apresentar de um jeito diferente. Isso acontece porque não cuidamos dos padrões que nos levam a esse mesmo tipo de problema. Não preciso dizer que é aí que a psicoterapia atua, não é?
Você não precisa ser terapeuta de seu amigo, ou de seu familiar, aliás, nem deve, pois esse não é o seu papel. Indicar ele pode ser suficiente. Algumas vezes, somos convidados a compartilhar o não saber, e isso exige uma postura de “sustentação silenciosa”. Apostamos no encontro autêntico com o outro e no tempo para se deparar com a questão, aprofundando-a e cuidando-a.
Cristina Gonçalves de Abrantes
Psicóloga CRP 06/135259